terça-feira, 1 de junho de 2010

Se ele não vier, eu virei

Depois de um sono pesado e merecido, abria os olhos, e a visão do quarto vazio, aos poucos, se tornava nítida. “Ah, era mesmo sonho, ele não veio”. As lágrimas que desciam pelo rosto de Cláudia embaçavam um porta-retrato, ao lado da cabeceira de sua cama. Contemplava os olhos claros que várias vezes lhe haviam feito promessas. Lembrava-se da época, que julgava ter sido a melhor de sua vida, nove meses atrás; os carinhos no quarto escuro, o prazer do proibido, do desconhecido. Agora era tarde para ouvir seus pais, para voltar atrás. Vinham-lhe o arrependimento, o medo, e as memórias recentes do parto.
Ouviu batidas na porta, e logo encarou seu melhor amigo, que trouxera flores para a nova mamãe. Sentia o conforto daquele abraço, de alguém que nunca quebrara a sua palavra, que nunca lhe faltara nos momentos mais difíceis, e ali estava.
– Thiago, ele não veio, o parto foi horrível. Eu estava sozinha – e mais lágrimas molharam seus cabelos e sua camisola.
– O que eu vou fazer agora? – O amigo alisava os cachos amassados. – Se ele não vier, eu virei.
Uma semana se passara, desde o nascimento de sua filha. Do seu quarto foram tiradas a penteadeira e a escrivaninha, que deram lugar ao berço e às fraldas. Todos os dias, Cláudia esperava pela chegada do melhor amigo, que cuidava do neném, enquanto ela se arrumava para dormir. Não terminara a faculdade, não tinha emprego, não gostava de pedir ajuda para seus pais. Sua filha não teria uma família completa.
Uma tarde, enquanto sua filha dormia, Cláudia tirava um tempo para si, arrumando seu armário. Mexia em uma gaveta de recordações, quando abriu a carta que recebera de Thiago, no colégio. Thiago a surpreendera em uma festa, quando se declarou, por carta, para Cláudia. Mas ela nunca o correspondera... Agora, estranhamente, sentia saudades daquela noite... sentia saudades de Thiago. Uma saudade que se misturava com ternura, com desejo, com amor.

Um comentário: