quarta-feira, 28 de março de 2012

Anatomia

Depois de algumas idas ao laboratório de anatomia, tenho me surpreendido muitas vezes em pensamentos céticos. Para que eu construo, com tanto trabalho, uma vida confortável para um corpo que vai apodrecer? Como eu posso pensar com tranqüilidade que meus tão verdadeiros amores terão fim? Por que vou ajudar pessoas a viver melhor se elas vão morrer também? Espelho. E eu sinto que eu não posso ser à toa. Meus olhos. Eles têm uma tarefa. Minha boca. Eu não me fiz, não decidi ter nascido, não tenho lembranças de antes de nascer, não sei onde estava. Eu não estava. E agora estou. Ainda estou. Podia já ter apodrecido, mas estou. Vejo beleza em mim, na minha vontade de viver, no meu rosto. Não pode ser só isso! Ninguém ia decidir viver se fosse só isso! Mas as pessoas querem viver, eu quero viver, muito. Não é justo que eu seja à toa, definitivamente, não sou. Não decidi ser, não decidi continuar sendo e não sei até quando serei. Pertenço.

3 comentários:

  1. “Para que eu construo, com tanto trabalho, uma vida confortável para um corpo que vai apodrecer? Como eu posso pensar com tranqüilidade que meus tão verdadeiros amores terão fim? Por que vou ajudar pessoas a viver melhor se elas vão morrer também?“

    Gostaria de fazer estas perguntas para Petrarca, e depois para Nietzsche...

    “'Qual o significado último da existência?''Por que existem a dor e a morte? Por que, no fundo, vale a pena viver?'“

    “Havia em Garbagnate, perto de Milão, um sanatório, para onde fui a fim de visitar uma pessoa. Quando saía, fui chamado por um enfermeiro: um doente estava morrendo... Era um jovem de pouco mais de vinte anos, muito simples e puro. Impressionou-me porque, na sua situação, parecia contar, serenamente, as batidas do coração e dizer: 'Mais uma...' Aquele jovem morreu tranquilo. E refleti: se alguém tivesse consciência plena da morte que está chegando, a sua autoconsciência sentiria esgotadas suas perguntas? Ou as sentiria mais exasperadas?“

    “...pelo simples fato de viver cinco minutos, um homem afirma a existência de um 'quid' pelo qual vale a pena, no fundo, no fundo, viver aqueles cinco minutos."

    (Veja você se descobre quem disse essas coisas)

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